Quando alguém do sul se refere ao "povo lá de cima" (em geral o nordeste), sempre é em tom de preconceito. E sempre noto duas coisas:
- 99% das vezes o sulista jamais pisou nas terras "lá de cima", e quando o foi, foi com pacote turístico
- falar mal do "povo lá de cima" tem a função de valorizar, por comparação, o sul. Só que é um conto do vigário, pois nem "lá em cima" é desse jeito, nem o sul anda bem das pernas!
É a típica tentativa de vencer uma partida por 0 a -1
Dia desses alguém vai escrever como Foucault é mal entendido, e uma das noções campeãs é a de "cuidado de si".
Ele usa o termo com um cuidado imenso, mostra o contexto histórico e os usos, as inflexões de significado em diferentes autores.
Aí chega gente com doutorado dizendo, no século XXI, que pratica ou já viu praticar, ou formula práticas "foucaultianas" de "cuidado de si".
Brazilian #museums enter the #Fediverse:
"…a #socialnetwork instance dedicated to hosting museums and public #memory institutions…to preserve data from audience interactions as a digital collection for research purposes."
Dentre os meus alunos, ninguém ou quase conhece o mastodon. Mas muita gente conhece as outras coisas.
Muita gente que depois se forma ainda cai na lorotice de ter que engajar em rede social para conseguir algum espaço.
Isso diz muita coisa. Dentre elas, o fato de que o jovem é tão solidamente formado pelas redes sociais, elas lhe fazem tanta parte, que não há muita iniciativa para quebrá-las ou buscar alternativas.
E o segredo todo está em "fazer parte": não é apenas usar algo, mas ser atravessado por aquilo no próprio ser.
A vida e suas ironias: aprendo com Michel Onfray, ateu e materialista, que a mudança de costume da Igreja católica após o Concílio Vaticano II, de fazer com que o padre reze a missa virado aos fiéis e não ao altar, é uma quebra do sagrado.
Onfray explica: as igrejas sempre foram "orientadas", isto é, viradas ao oriente, a onde vem a luz, ao lugar de Cristo, do sagrado. Isso leva primeiro ao altar, depois ao padre, depois ao povo: todos rezando "orientados".
Aprendi que o padre rezava de costas para o povo; mas não era de costas para o povo, e sim todos de frente para Deus.
Quantas sutilezas! E quantos resultados!
Toni Negri, Operaísta
Comecei a tentar escrever um texto sobre como o direito ao silêncio seria importante aos brasileiros: o silêncio, ao invés de reforma e makita no sábado de manhã e funk de madrugada, tocando o fd-se para os vizinhos.
Mas respeitar o silêncio é tão fora de cogitação para o brasileiro que... ficarei em silêncio.
A literatura sobre Foucault é bastante grande e, com isso, vem aquele efeito dos abundantes textos que, para comentar suas noções, não fazem a mínima lição de casa. É incrível o número de artigos "profundos", por vezes elogiados, que redesdobrem a roda e, ao mesmo tempo, sequer leem as passagens nas quais a roda está implicada.
Um exemplo (para citar só um) é esse artigo (https://philarchive.org/archive/DECFM-2), que aproxima a noção de "meio" das análises de Foucault, por exemplo sobre a biopolítica. Desde seus escritos iniciais, Foucault põe sob problema a noção de meio, com todas as suas derivações possíveis. Inclusive - não vou dizer onde -, Foucault faz uma contundente arqueologia da noção de meio, cujos efeitos continuam sem análise durante décadas.
Sem analisar esses textos, o autor do artigo julga que há algo como correspondências ou empréstimos referentes à noção de "meio". A própria noção de biopolítica, citada no artigo, é um dos critérios analíticos pelos quais a noção de meio encontraria suas condições de possibilidade, e não um conceito que estaria aí para ser aproveitado ou ressignificado por Foucault.
Os algoritmos das outras redes são irritantes, são sempre restritivos quanto aos conteúdos, a única coisa que favorecem são as interações a despeito do conteúdo.
Uma das coisas legais do fediverso é voltar o valor do conteúdo pelo conteúdo.
Uma foto bonita será curtida e vista porque é bonita, e não porque foi um influencer turbinador de audiência que a tirou.
No instagram, o cara com 2 milhões de seguidores dá um curso sobre Bauman ensina do a amar solidamente em tempos líquidos.
A linguagem inteira, de cabo a rabo, é a do coach e das receitas que vc precisa seguir para ser feliz.
O cara simplesmente ensina de forma líquida e com finalidades líquidas a crítica aos tempos líquidos.
Sempre tive comigo a crença, aprendida no existencialismo, de que o outro é outra liberdade.
Essa crença era bastante otimista: o outro é outra liberdade, portanto pode decidir pelo melhor, decidir por aprender, por evoluir, por criar.
Essa crença evoluiu até chegar em seu contrário. Continuo acreditando que o outro é uma liberdade. Mas agora essa crença se formula em dúvida e ceticismo: será essa liberdade disposta a fazer diferente do que faz, de aprender, de não cair nas malhas do simplesmente cotidiano, banal, massificado, maquinizado, pequeno? Será ela capaz de afirmar os acertos e aceitar os próprios erros, de perdoar e pedir perdão, de saber que não é perfeito e nem fracassado, de viver sua vida em meio a outras liberdades?
A economia da crença não é mais a da confiança. É a da surpresa.
"Think you're escaping and run into yourself. Longest way round is the shortest way home."
Ulysses (1922)
~James Joyce (2 February 1882 – 13 January 1941)
Interesses: História da #Filosofia, História das #CiênciasHumanas, História da #Psicologia, Michel #Foucault. Também por #arte, #natureza e #fotografia.
Posto: o que vejo diante dos olhos, nessa curta vida. Compartilho links e coisas que me interessam, interajo, guardo informações, cito trechos, conjecturo, separo coisas para ler...
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