# Bruno Latour: “O sentimento de perder o mundo, agora, é coletivo”
El Pais, 29/3/2019
*Bruno Latour (Beaune, 1947) é um dos filósofos franceses mais influentes da atualidade. Acaba de publicar Down to Earth. Politics in the New Climatic Regime (Com os pés no chão. Política no novo regime climático, em tradução livre). O livro faz um diagnóstico sobre um mundo onde tudo é perturbado pela mudança climática e permite compreender fenômenos que vão das desigualdades até a globalização, passando pela ascensão do populismo. A obra também é um pedido de ação e um manifesto europeísta. E, finalmente, uma síntese do pensamento de um precursor de disciplinas como a sociologia da ciência sobre os fatos e a verdade.*
PERGUNTA. O senhor contou que uma vez, sobrevoando a baía de Baffin numa viagem ao Canadá, viveu um momento revelador ao ver como o gelo retrocedia. O que aconteceu?
RESPOSTA. Olhando pela janela, percebi que a placa de gelo, por sua forma, resumia o problema que vivemos. Ao estar no avião eu já não assistia a um espetáculo, mas o estava modificando, pois o CO2 que a aeronave emite influi na placa de gelo. Antes, esse espetáculo – o da placa de gelo vista do avião – teria tido um caráter sublime. Agora é complicado senti-lo assim. Se te dizem que você é responsável pelo que vê, o sentimento é diferente, é uma forma de angústia.
P. Essa é a vertigem da qual fala no livro?
R. Antes, a angústia que a natureza nos causava vinha do fato de que éramos pequenos demais, e a natureza era imensa. Agora temos o mesmo tamanho, influímos em como a Terra se comporta. E é desorientador, por exemplo, para os jovens que se manifestam [contra a mudança climática]. Da extrema esquerda à extrema direita, todas as posições políticas estão marcadas pela angústia.
P. No caso dos coletes amarelos ou dos eleitores de Trump, a angústia é mais econômica que ambiental, não?
R. É como se o solo do país onde estou já não me fosse favorável. Não é ecológica no sentido da natureza, mas é do território. O problema é esse sentimento de perder o mundo. Já existia antes, mas eram os artistas, os poetas, que o sentiam. Agora é um sentimento coletivo.
P. Segundo o senhor, uma elite, ante essa situação, diz: “Vamos embora”. Abandona o barco.
R. Comparemos isso com as reações fascistas dos anos trinta. Há semelhanças, uma espécie de retirada nacional, étnica. Mas naquela época eram projetos de desenvolvimento.
P. Desenvolvimento em que sentido?
R. Era uma loucura, mas era um projeto de civilização. Agora estamos diante de um projeto para desfazer os vínculos, abandonar as construções. A reação mais extraordinária de Donald Trump consiste em dizer: “Nós não temos problemas de mudança climática; é algo que ocorre na casa de vocês, não na nossa.” Ele considera que o continente americano não está sujeito aos mesmos problemas climáticos que a Europa ou a China. Isso é uma novidade.
P. Mas Trump é uma exceção, não? O Acordo de Paris para combater a mudança climática foi firmado pelos Governos do mundo todo, o que poderíamos chamar de elites.
R. Essa ideia de abandonar as obrigações é compartilhada agora também pelo Brasil, e consiste em dizer: “Vamos embora.” Essa é a versão Trump, mas existe outra variante high tech que diz: “Nós também vamos, mas rumo a um futuro tecnófilo extremo.” É o projeto californiano, pós-humano, Marte, a inteligência artificial, os robôs. O interessante é que agora existem pessoas que vivem em planetas diferentes.
P. E outras, diz o senhor, que fogem para o âmbito local.
R. Sim, a reação dos que se sentem abandonados pelos que vão embora para Marte é regressar ao Estado-nação como o imaginam, um Estado-nação imaginado, uma ficção. O exemplo é o Brexit. Ao contrário dos fascismos, não há um retorno a uma conquista territorial, e sim a um Estado-nação vazio de todo sentido prático. Então alguns vão para Marte, outros regressam ao planeta nacional, que também é abstrato, e no meio estamos os infelizes que pensamos que, em um momento ou outro, será preciso aterrissar: reconciliar a economia, o direito, a identidade com o mundo real do qual dependemos.
P. Aonde regressar exatamente?
R. Ao [plano] terrestre. Pode parecer estranho: por que aterrissar se já estamos na Terra? Mas os europeus, os ocidentais, temos vivido numa Terra muito utópica. Imaginávamos que ela se desenvolveria ad infinitum, sem limites. Mas o sonho de que o planeta se modernizaria indefinidamente nunca foi verificado, não tinha fundamento material. Desde o século XIX, com o carvão e o petróleo, a economia havia se tornado infinita. E há uma angústia geral por esse desajuste.
P. Diante disso, pode haver uma ideia compartilhada da verdade?
R. As pessoas se queixam das fake news e da pós-verdade, mas isso não significa que sejamos menos capazes de raciocinar. Para conseguir manter um respeito pelos meios de comunicação, a ciência, as instituições, a autoridade, deve haver um mundo compartilhado. É um tema que estudei no passado. Para que os fatos científicos sejam aceitos, é preciso um mundo de instituições respeitadas. Por exemplo, sobre as vacinas se diz: “Estas pessoas ficaram loucas, estão contra as vacinas.” Mas não é um problema cognitivo, de informação. Os que são contra não serão convencidos com um novo artigo na revista The Lancet. Essas pessoas dizem: “É este mundo contra este outro mundo, e tudo o que se diz no mundo de vocês é falso.”
P. Os fatos não existem independentemente desses mundos?
R. É preciso sustentar os fatos, não vivem sozinhos. Um fato é só um cordeiro frente aos lobos.
P. Quem são os lobos?
R. Os que devoram os fatos. Um fato deve estar instalado numa paisagem, sustentado pelos costumes de pensamento. São necessários instrumentos e instituições. As vacinas são o exemplo de um fato que precisa de uma vida pública. Se eu sair pela rua com uma seringa tentando vacinar as pessoas, serei considerado um criminoso. Se a vida pública é deteriorada por pessoas que consideram que – não importa o que você disser – este não é o mundo delas, os fatos não servem para nada.
P. Mas nesse caso há um fato: as vacinas são úteis, não importa se os outros acreditam ou não.
R. No meu mundo e no dos leitores do EL PAÍS, sim. Mas nem todo mundo lê o seu jornal, nem tem um doutorado, nem confia nas instituições médicas, nem vive num país onde o Ministério da Saúde apoia as vacinas. É preciso muita coisa para sustentar os fatos.
P. Os dois mundos valem o mesmo?
R. Não, mas estão em guerra. É um problema geopolítico. Antes, eram problemas de valores ou ideologia, mas num tabuleiro estável. Agora, não. O mapa está em discussão. “Na América não há problema climático, isso é falso”, diz Trump.
P. Qual é a solução?
R. Se aterrissarmos no terrestre, poderíamos começar a definir um mundo comum. Então já não poderíamos nos permitir dizer que não há mudança climática, que os problemas de saúde não nos dizem respeito, que a reprodução das abelhas não é nosso problema. Voltaríamos a discutir entre civilizados.
@letcesar.bsky.social piada pronta
Numa terra distante, onde as estepes douradas da Rússia encontravam os rios sagrados da Índia, vivia um estudioso chamado Vasili.
Nascido numa linhagem de guardiões da sabedoria, Vasili passava seus dias imerso em textos antigos — alguns inscritos no delicado sânscrito das Upanixades, outros na tinta sombria das lamentações de Dostoievski. Ele buscava, acima de tudo, dominar o próprio tempo.
Um dia, um sábio errante chegou ao estudo de Vasili, carregando uma ampulheta peculiar. Diferente de qualquer outra que Vasili já vira, sua areia não escorria constantemente para baixo — ela pairava, suspensa, como se aguardasse permissão para cair. O sábio sorriu e colocou a ampulheta sobre a mesa do estudioso.
“Esta é a Ampulheta do Guardião do Tempo”, disse o sábio. “Vire-a, e você poderá vislumbrar seu passado ou seu futuro. Mas cuidado — você pode perder o que é mais precioso.”
Ansiosamente, Vasili virou o vidro.
Imediatamente ele se viu como um menino, aprendendo sânscrito sob o olhar severo de seu avô. As mãos do menino tremiam enquanto ele traçava versos sagrados, seu coração ansiando por um futuro em que seria sábio e reverenciado.
Fascinado, Vasili virou o vidro novamente. A areia se inverteu, e agora ele se viu como um velho — rico, respeitado, mas cheio de uma tristeza inexplicável. Ele estava sentado sozinho em uma grande sala, suas mãos repousando sobre livros não abertos, sua mente doendo pelas anos perdidos em estudos.
Vasili estendeu a mão para tocar seu eu futuro, mas no momento em que o fez, toda a visão se desfez. A ampulheta rachou, e a areia dentro dela se transformou em pó. O sábio, ainda sorrindo, falou mais uma vez.
“Você passou a vida correndo atrás do tempo, Vasili. Mas o passado é um sussurro, e o futuro é uma miragem. Apenas o presente é real. Se você não vive agora, você nunca viverá de verdade.”
Naquele momento, Vasili sentiu algo que nunca sentira antes — o peso do agora. O calor do sol em sua pele. O cheiro da tinta secando no pergaminho. A respiração em seus pulmões, nem de ontem nem de amanhã, mas apenas deste momento.
E pela primeira vez, ele não alcançou outro livro. Ele simplesmente sentou, ouvindo o mundo como ele era, e não como ele desejava que fosse.
Há um hype de estudantes universitários que se reúnem para fazer pregação religiosa na universidade. Estão vendendo isso como se a universidade proibisse os cultos, sob aquele preceio de que "o Evangelho deve ser propagado em qualquer lugar", quase como um gesto de libertação contra a "repressão" da universidade.
Eu enxergo nisso tudo um fenômeno mais profundo.
A universidade jamais proibiu nada. E como é um lugar de ciência, de discussão, de conhecimento, ela sempre permitiu a experimentação em diversos campos. Sendo lugar de todas as ciências, também jamais proibiu experimentações culturais e artísticas, muitas das quais já foram confundidas com vagabundagem e balbúrdia. Além disso, porque é a expressão mais alta da racionalidade ocidental, a universidade é há séculos lugar de contestação e crítica.
Nisso, ninguém jamais foi proibido de manter suas crenças anteriores dentro da universidade. A questão é que, fora da universidade, muitas crenças não são/eram apenas difundidas, mas são impostas. Que se veja a repressão dos traficantes e milicianos evangélicos a muitos cultos afro do RJ, por exemplo. A universidade seria ou deveria ser, nesse sentido, muito mais um lugar de interrogação sobre por que muitos cultos são recusados e outros impostos.
A universidade carrega consigo aquele velho tema de que a razão, em si mesma, não tem poder algum senão o de convencimento, e por isso a ciência e a democracia seriam as maneiras menos piores de se viver.
Mas nos anos 2000 há quem, faltando com a razão, muito oportunamente quer fazer valer seus interesses e exercer seus poderes invertendo os termos, dizendo que a universidade sim é que é repressora. E assim se torna possível destruir a universidade dentro dela mesma, com essas simulações de religião que, se fossem sinceras, estariam na igreja.
@ritawho very nice, where is it?
O sulista fala mal do #Funk carioca. Aí você pergunta "e o que você ouve?"
- Sertanejo universitário
Quando te disserem que o problema das #fakenews não é sério, mostre esse vídeo:
https://www.instagram.com/reel/DHbjA9wRqRl/?igsh=MWR4cmtmaGQzMXpmbw%3D%3D
Frequentemente a gente fica quieto quando vê um absurdo. Ficamos silenciados ou constrangidos a falar.
A estratégia da #ultradireita é o contrário: é povoar as mídias, botar tudo para falar, no famoso recurso do #tiodowhatsapp . E tanto melhor se ficarmos calados.
É aí que está o essencial: povoar as redes, ou deixar que a ultradireita a povoe.
Em #Curitiba a prefeitura está criando estratégias para desarticular as gestões públicas historicamente conquistadas e criar filões de exploração privada dos cupinchas, vulgo mamata, quer dizer, "parceria público-privada".
Uma bola que ficou quicando: no início da pandemia #COVID em março de 2020, muita gente imitava os europeus e ficava nas janelas aplaudindo os médicos.
As campanhas de desinformação e #FakeNews do #Whatsapp não tardaram. Não muito depois, essas mesmas pessoas se puseram contra o isolamento social e começaram a defender antibiótico e vermífugo para curar vírus.
Eis aí uma das maiores campanhas de publicidade do Brasil, caso ainda mais importante que a revolta da vacina, pois já ceifou mais de 700 mil vidas.
Denunciei no #facebook uma postagem da "Direita Nacional" na qual ela divulga explicitamente uma campanha de intolerância (usando essa palavra) "contra o PT" (sic.). Não se trata de antipatia ou rivalismo, mas de campanha de ódio, e não "contra o #PT", sim contra tudo o que discorda da pauta, que é chamado de "petista".
O facebook não removeu.
É Big Tech sendo Big Tech, e a única coisa que mantém isso aqui somos nós.
Retornarei ao processo de desintoxicação dessas #BigTechs, cultivando o #Mastodon
FOSS infrastructure is under attack by AI companies https://thelibre.news/foss-infrastructure-is-under-attack-by-ai-companies/ Please boost for awareness, reach and to public shame Microsoft, Meta, OpenAI, Perplexity and other such AI companies.
@DeBMC esse deve votar forte no B
@josemurilo @letcesar.bsky.social @bsky.brid.gy
Mas um seguidor de bsky consegue interagir conosco no fediverso?
Interesses: História da #Filosofia, História das #CiênciasHumanas, História da #Psicologia, Michel #Foucault. Também por #arte, #natureza e #fotografia.
Posto: o que vejo diante dos olhos, nessa curta vida. Compartilho links e coisas que me interessam, interajo, guardo informações, cito trechos, conjecturo, separo coisas para ler...
tootfinder